terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Estantes infinitas

No lugar da poeira das estantes, dois mil livros podem ser acomodados em um único aparelho que cabe na palma da mão. É o chamado leitor virtual que chegou ao Brasil no final de 2009 e já aponta novas perspectivas no mundo editorial. Ali se pode colocar uma infinidade de obras literárias, revistas, jornais e ir aumentando o espaço através de cartões de memória. Além disso, os leitores virtuais abrem a possibilidade para folhear os livros com os dedos e também não são como as telas dos computadores, as telas lembram papéis por não ter luz, oferecendo a mesma aparência de impressões feitas em papel, pois a e-ink funciona praticamente da mesma forma que a tinta convencional, através de micro cápsulas compõem a tela e estão repletas de partículas brancas positivas e pretas negativas.

No Brasil chegaram dois aparelhos, do Amazon (Kindle) e da Sony e-600. Antônio Prata em seu blog no Estadão disse sobre um deles: “O Kindle é assim. Faz um esforço danado para ser um livro mas, embora esteja mais perto do original de papel do que o bolinho de soja está para a carne, não é. Pareceu-me um objeto útil e fácil de usar, mas esse desejo indisfarçável de ser uma outra coisa me deixou desconfiado. Com uma certa pena, até, como se ele fosse um patinho feio dos hardwares, um Pinóquio dos eletrônicos, cujo grande sonho fosse ser de celulose, como seus amiguinhos que moram todos juntos, nas prateleiras”.

A escritora Clotilde Tavares que acaba de comprar o seu leitor virtual pensa ao contrário. Achando os “kindles” do Amazon uma armadilha por só poder baixar obras compatíveis ao aparelho, ela optou pelo da Sony e-600 e acredita ser esta uma maneira interessante de ler livros. “Ler na tela de computador é muito ruim pois com o tempo a luz passa a esturricar seus olhos. Tenho em meu computador mais de 600 livros digitalizados e meu desejo hoje é passá-los para o equipamento. Achei interessante pois no leitor digital, a gente pode sublinhar, fazer anotações e passar as páginas com os dedos”, disse Clotilde.

A escritora lançou recentemente dois livros no mundo virtual, “Coração parahybano: crônica, literatura e memória” - editado pela Linha Dágua em 2008 - e acaba de lançar “Formosa és: memórias do internato”. O primeiro já soma mais de 500 acessos desde outubro no ar. “A literatura acredito está vindo com maior maturidade para encarar a tecnologia. As gravadoras de música precisaram se adaptar e os músicos sabem que não ganham mais dinheiro com discos, mas com shows e hoje a literatura também muda. O que ganho com a minha habilidade de escritora? Percebo que na internet, os livros ganham notoriedade e eu cobro meu cachê nas palestras. Tudo muda, desde a maneira de ler um livro, a sobrevivência do escritor, até as trocas com os leitores”, disse Clotilde, lembrando que seu projeto para 2010 é lançar um livro seu por mês até dezembro.

Enquanto os leitores virtuais não tomam conta do Brasil, as estantes virtuais vão se enchendo de obras raras e escritores novos. No blog Substantivo Plural (www.substantivoplural), por exemplo, o editor Tácito Costa disponibilizou mais de 15 obras de autores consagrados e outros novos como o livro de poesia “A Vida é Grátis” de Everton Dantas.

Na visão da escritora Clotilde Tavares o lançar de livros no mar virtual abre espaço para uma troca com os leitores e também a possibilidade de novos escritores se encorajarem para abastecer o mundo editorial. “Recebo e-mails de gente que nunca conversei na vida. Muitos leram meu livro e entram em contato para contar o que acharam. Antes isso era raro. Sou uma escritora, não sou editora nem comerciante de livros. O que quero é que o povo leia, por isso meu desejo é disponibilizar os todos neste mar. O mais interessante é que as vendas dos livros impressos também aumentaram com o livro virtual, por tudo isso, acho uma bobagem para o escritor continuar preso ao mercado literário de papel”.

Para o escritor e jornalista Cefas Carvalho, “é válida toda forma de divulgação de textos literários”. “Muita gente boa com textos já publicados tradicionalmente, como Clotilde Tavares, estão aderindo a divulgação de livros virtuais, na qual o leitor baixa o livro a custo zero e pode tanto lê-lo na tela do computador como imprimi-lo. Isso significa a divulgação de literatura sem os altos custos gráficos e de lançamento. Por outro lado, considero importante, essencial mesmo a edição tradicional, de livros em papel, que podem ser lidos na praia, na filda do banco, no ônibus”, disse Cefas ao VIVER.

Para ele, há que se ter cuidado também em relação aos jovens autores que aos poucos podem ir se tornando escritores virtuais sem jamais ter publicado uma linha em papel. “Trata-se de uma nova literatura? Certamente, mas devem os lembrar que a publicação ajuda a separar o joio do trigo e da mesma forma que os blogs fazem qualquer um que jamais pisou numa redação de jornal se achar “jornalista”, os blogs e sites “literários” podem fazer qualquer escrevinhador de quatro linhas se considerar um ‘escritor’”, defende.

Como funciona

Os leitores virtuais funcionam com 3G gratuita. De acordo com a Amazon, o Kindle usa a mesma tecnologia 3G dos celulares, porém é totalmente gratuita e serve, essencialmente, para baixar e comprar os mais de 350 mil livros da loja Kindle. Esta conexão 3G ficará disponível para as capitais brasileiras e parte da região litorânea. O preço de cada obra varia de US$12 a US$6, mas não há informação se estes valores serão adaptados à moeda brasileira. O download dos livros será feito em até 60 segundos.

Para baixar os livros de Clotilde:

Crônicas da Parayba: http://www .clotildetavares.com.br/cp

“Formosa És: Memórias de internato”

http://www.clotildetavares.com.br/formosaes.pdf

Rubem Fonseca e coleção Aplauso

Junto à chegada dos leitores virtuais (e- books), o número de livros para baixar na internet aumenta cada dia mais. Um exemplo é a coleção “Aplauso” lançada pela Imprensa Oficial que disponibilizou todo seu acervo – mais de 200 livros de biografias de artistas, cineastas e dramaturgos além de roteiros de cinema, peças de teatro e a história de diversas emissoras de TV. Com um clique você tem acesso a todos os livros que desejar ler.

O escritor Rubens Fonseca foi o primeiro a ter seu livro em duas versões. A impressa pode ser comprada por R$ 36,90 e a digital por R$ 19,99 reais, através da editora Agir. Existe também a possibilidade da existência do chamado Google-book para oferecer acesso gratuito a livros, ficando com 30% da venda de outros, como parte do acordo com as editoras. O impasse é o chamado “Open Book Alliance”, encabeçado pelo Internet Archive. O Archive tenta barrar um acordo que dá ao Google os direitos digitais de milhões de livros protegidos ao redor do mundo alegando que o Google pode minar o mercado editorial.

Fonte: Tribuna do Norte